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Aeroportos atraem grandes marcas e lojas especiais apesar dos altos custos de aluguel
Aeroportos atraem grandes marcas e lojas especiais apesar dos altos custos de aluguel
Empresas apostam em propostas instagramáveis para chamar atenção de viajantes
Por Flávia G. Pinho/Folhapress
20/12/2025 às 09:00
Foto: Paulo Pinto/Agência Brasil/Arquivo
Movimento no Aeroporto de Guarulhos/Paulo Pinto/Agência Brasil
Por mês, mais de 2 milhões de pessoas caminham —ou correm— pelo corredor de acesso aos portões de embarque do Terminal 2, o mais movimentado do aeroporto de Guarulhos, em São Paulo, destinado aos voos domésticos. Há três meses, no entanto, poucas passam diante da nova filial da hamburgueria Patties sem reduzir a marcha para dar ao menos uma espiada.
Projetada pelo escritório de arquitetura Ohtake, a loja de esquina, com 100 m², tem a aviação como tema. Atendentes vestidos como comissários de bordo são chefiados por um gerente trajado como piloto. Os pedidos são entregues por meio de uma esteira igual às de bagagem e vêm dentro de sacolas em forma de malas, desenhadas pela Allbags.
O cenário é impactante, mas o que mais chama atenção é a tabela de preços —R$ 26 pelo cheeseburger. Verdade que nas outras três filiais da rede, famosa pelos preços mais camaradas, o mesmo lanche é R$ 6 mais barato. Ainda assim, é um valor surpreendente dentro do aeroporto, onde os preços salgados são de tirar o apetite.
Fundador da Patties, Henrique Azeredo investiu R$ 3,5 milhões na nova filial e traçou um plano de negócios no mínimo curioso. A meta, ele diz, é faturar o suficiente para cobrir as despesas, que não são baixas —a começar pelo aluguel que, por contrato, ele é proibido de divulgar.
Profissionais do mercado, ouvidas pela reportagem, estimam que uma área deste tamanho no embarque do Terminal 2, o filé-mignon do aeroporto em termos de circulação, não saia por menos de R$ 500 mil mensais.
"Ficaria feliz se empatasse, mas já estou conseguindo uma gordurinha", afirma o empreendedor, que entrega 300 mil hambúrgueres por mês, incluindo as vendas das duas lojas de rua, da unidade no Shopping Tamboré e do delivery.
Para elaborar o projeto da nova filial e definir a tabela de preços, Azeredo passou um dia inteiro dentro do terminal, observando clientes das lojas que seriam suas vizinhas. Como não obteve autorização da segurança, comprou uma passagem só para ter acesso à área restrita.
Em uma lanchonete, constatou que 60% das pessoas conferiram o cardápio e foram embora. "Senti duas coisas: que o consumidor do aeroporto vive com pressa, por isso optei por um design que chama atenção, e que o preço é uma questão sensível. Muita gente xinga os atendentes".
Outras grandes marcas têm apostado nos aeroportos. O T2 de Guarulhos também foi a escolha da Nestlé para a primeira e, até agora, única loja Mundo Ninho do mundo. No balcão, brigadeiros a R$ 9,90 e outras guloseimas dividem espaço com souvenires.
Inteiramente amarela, cor das embalagens do leite em pó, a loja é a primeira que se vê ao sair da área de raio-X. O ponto, segundo Patricia Tigre, diretora de marketing de leites da Nestlé, foi escolhido pela visibilidade.
"Optamos por um ponto de grande fluxo, onde podemos oferecer uma pausa afetiva. A repercussão tem sido enorme, o ambiente é instagramável e muita gente entra para tirar fotos", diz a executiva.
Neste mês, o T2 também passou a ser o novo endereço da loja de chocolates Garoto, que pertence à Nestlé. A marca investe em aeroportos desde o ano passado. Com unidades já funcionando em Vitória e Goiânia, pretende chegar a dez lojas até 2026.
"A de Guarulhos será como uma minifábrica. O consumidor poderá escolher o mix de bombons para a caixa, por exemplo, e comprar presentes, como canecas e toalhas", diz Paula Munhoz, diretora de marketing da Chocolates Nestlé.
A aposta da multinacional se escora na experiência bem-sucedida da marca Nescafé, que tem cafeterias em aeroportos desde 2018. A primeira foi a de Congonhas, em São Paulo.
"Na época, falar direto com o consumidor em uma operação B2C [vendas ao consumidor] foi um teste. Deu certo, fecharemos o ano com mais de 30 lojas em aeroportos", afirma Leonardo Tauil, gerente de bebidas da Nestlé Professional.
A rede de cervejarias Living HNK, que o Grupo Heineken implanta em aeroportos brasileiros desde 2015, também cresce de forma acelerada —já são 39 unidades.
"A primeira operação, no Terminal 3 de Guarulhos, tem 252 m² e começou como um teste, que culminou na maior de todas, no Terminal 2, com 3.000 m²", conta Ricardo Piccoli, diretor regional do grupo para São Paulo e Sul.
Os preços são salgados. Chopes de 300 ml, a R$ 27,90, acompanham hambúrgueres criados pelo chef Dalton Rangel, a partir de R$ 89,90.
O tráfego garantido é a moeda de troca oferecida pelas concessionárias. Segundo Juan Sanchez, diretor comercial da Aena, que administra 17 aeroportos, incluindo Congonhas, o aluguel de cada ponto é calculado com base na expectativa de faturamento.
"Congonhas recebe 100 mil pessoas por dia, somando passageiros, familiares e a comunidade aeroportuária, das 4h às 23h. O faturamento é o dobro do obtido por uma loja de rua".
De acordo com a consultora de marketing do Sebrae-SP, Silmara Regina de Souza, o comportamento do consumidor, dentro de aeroportos, foge à regra geral e ajuda a turbinar o caixa. "A pessoa está presa ali, no modo viagem e com tempo. No contexto psicológico de viajante, muda a disposição para comprar e há mais propensão para gastar", afirma.
O aluguel alto não é o único vilão na composição dos preços. As normas de segurança, principalmente dentro das áreas de embarque, aumentam a complexidade —e o custo— de tarefas simples, como consertar um equipamento ou repor mercadorias.
"Tudo passa pelo raio-X, até envelopes, e celulares não cadastrados são confiscados. Durante a obra, até as latas de tinta eram abertas e inspecionadas", conta Henrique Azeredo. Por essas e outras, as marcas da Nestlé, assim como a Heineken, preferiram entrar nos aeroportos em parceria com o Grupo Fit, especializado nesse tipo de negócio, com mais de 50 operações.
Segundo a consultora do Sebrae-SP, o horário de funcionamento ampliado, que obriga a formação de equipes em vários turnos, com mais gerentes, também eleva os custos. A Patties, por exemplo, está aberta das 6h às 23h e foi obrigada a desenvolver um menu de café da manhã para a nova filial.
Fenômeno que coincide com a privatização dos aeroportos brasileiros, o incremento das áreas comerciais está só começando, como adianta o diretor da Aena. Em Congonhas, a ampliação não vai se limitar ao novo espaço de embarque remoto, inaugurado em agosto —a empresa investe R$ 2,4 bilhões em obras que, entre outras melhorias, vão resultar em 20 mil m² dedicados a áreas comerciais até junho de 2028.
A tendência, avisa o executivo, se espalha pelo Brasil. Em outubro, a empresa anunciou que está ampliando o espaço de lojas de quatro aeroportos no Pará, três de Minas Gerais e três de Mato Grosso do Sul. "Com essa nova proposta, que melhora a experiência do passageiro, quem só gastava R$ 20, comprando uma água e um pão de queijo, vai gastar quatro, cinco vezes mais".
