Entrevista - Jonas Paulo: “Não será fácil para o PT”
Por Política Livre
27/10/2025 às 08:17
Atualizado em 28/10/2025 às 15:50
Foto: Divulgação
Passada a acirrada disputa interna no Processo de Eleição Direta (PED), recheada de denúncias de irregularidades e até de mortos como eleitores, integrantes do PT da Bahia iniciaram o movimento de cicatrizar as feridas e reagrupar as forças para próximo desafio eleitoral da porta para fora, que coloca em jogo a hegemonia de 20 anos do grupo no Governo do Estado. Entre os que dizem já ter virado a página está o ex-presidente estadual Jonas Paulo, derrotado por Tássio Brito no último PED, a quem fez duras críticas ao longo da campanha.
Nesta entrevista exclusiva, concedida ao Política Livre na última terça-feira (22), quando seguia para uma reunião da Executiva do PT na Assembleia Legislativa, Jonas afirma que, como um dos fundadores, tem “responsabilidade com a condução do partido”, apontando que se avizinha uma corrida difícil. “Estamos trabalhando numa linha de construir a unidade, porque a disputa não será fácil”.
Ele diz que o legado de cinco mandatos credencia o grupo a uma nova rodada, mas adverte os correligionários a não “negligenciar a força do adversário”, nem ainda deter-se em debates laterais, a exemplo da formação da chapa ao Senado, senão em consolidar a liderança do governador Jerônimo Rodrigues. “Nós não podemos abrir um debate que não aponte a afirmação de uma liderança com maior longevidade, que é Jerônimo”.
Sobre o desenho nacional, Jonas Paulo diz que o PT baiano terá novamente a missão de assegurar a margem de votos para manter Lula no Planalto por mais quatro anos, “porque lá no Sul as coisas continuam mais ou menos parecidas […] O quadro lá embaixo não evoluiu”.
Leia a entrevista completa:
Como ficou o ambiente no partido depois que decantou aquela disputa acirrada do PED?
O ambiente está tranquilo, eu sou fundador do PT, portanto tenho responsabilidade com a condução do partido. Eu estou indo para a direção nacional, para a direção da Fundação Perseu Abramo, estou aqui no governo coordenando o plano estratégico de desenvolvimento do Estado, estamos trabalhando numa linha de construir a unidade, porque a disputa não será fácil. Aqueles que acham que a disputa será fácil estão enganados. Nós precisamos consolidar a liderança do governador no Estado, precisamos trabalhar o governador como uma liderança jovem que abre a perspectiva, de fato, da modernização da Bahia, de criar esperança para o povo da Bahia. Já fizemos a democratização, já fizemos obra, mas nós precisamos apresentar o futuro, um futuro estável, um futuro de desenvolvimento, um futuro em que a Bahia ocupe o seu lugar no país, e essa liderança chama-se Jerônimo Rodrigues, que precisa ser afirmada junto com o presidente Lula. Nós temos que construir a geração pós-Lula, e a geração pós-Lula passa pela afirmação da liderança de Jerônimo. Não podemos entrar em discussões menores que não estão no centro da estratégia, porque para nós o mais importante é ampliar a bancada, eleger o governador, manter a Bahia como retaguarda estratégica da vitória nacional, botar a Bahia como centro decisivo das eleições nacionais junto com o Nordeste.
E que projeção o senhor faz para esse próximo ciclo eleitoral?
Nós não temos desgaste de material para dizer que o PT esgotou, não, nós estamos com muita vitalidade, com muita proposta […] O PT tem que ser a força que dialoga com a sociedade, resgatar a sua hegemonia. Quando eu saí da presidência, o PT tinha dez federais, 14 estaduais e 93 prefeitos. Nós vamos retomar essa ofensiva, respeitando os aliados, todos cresceram, mas o PT tinha o protagonismo e nós estamos buscando construir essa perspectiva. Eu estou muito confiante de que nós vamos para uma disputa difícil, tanto a nacional como estadual, eleição dura. Nós não podemos negligenciar as intervenções externas no processo brasileiro, não dá para pensar que os Estados Unidos vão assistir e bater palmas para essa eleição. Nós vamos ter que enfrentar as big techs, os próprios interesses americanos na eleição. O Brasil é o B dos Brics, então temos que estar tranquilos quanto a isso.
“Temos um excelente trabalho construído ao longo desses quatro mandatos, agora no quinto com Jerônimo, que nos coloca em condições de disputar. Não podemos negligenciar a força do adversário. Não podemos”.
Objetivamente aqui na Bahia qual é o grande desafio do PT para atravessar essa disputa difícil?
Primeiro, nós temos que manter essa toada de garantir as nossas forças e sermos capazes de aglutinar os aliados, manter a aliança e até ampliá-la é um objetivo nosso. Mas ao mesmo tempo esse processo passa pela construção de um protagonismo. O projeto tem que ter uma cara, tem que ter um projeto para renovar a Bahia, criar novas perspectivas, trazer a liderança nacional para a Bahia, desenvolver nossas ferrovias, nossos portos, aeroportos, erradicar a fome, diminuir a desigualdade social, afirmar a agricultura familiar. Tudo isso é muito difícil, não é uma coisa simples que faz de uma hora para a outra. E isso nós temos que estar muito conscientes da nossa responsabilidade. Agora, os nossos adversários na Bahia virão conforme vierem nacionalmente, eu não tenho dúvida. Eles trabalham nacionalmente na perspectiva de dois turnos, que eu acho que é a única forma que eles podem ainda pensar em enfrentar o presidente Lula. Isso vai repercutir aqui conforme eles vierem. Mas nós temos muita convicção que temos um excelente trabalho construído ao longo desses quatro mandatos, agora no quinto com Jerônimo, que nos coloca em condições de disputar. Não podemos negligenciar a força do adversário. Não podemos.
“Não dá para dizer que Jerônimo não tem marca, agora o que precisa é consolidar, isso aí é verdade”.
A oposição tem dito que o governador Jerônimo ainda não conseguiu colocar sua marca. Que avaliação faz disso?
O governador Jerônimo tem uma marca, de uma liderança emergente e que está fazendo investimentos estruturantes. Ele pegou o programa da escola em tempo integral e deu uma dinâmica maior, é uma marca da formação de quadros, da articulação do ensino do tempo integral, com o ensino profissional, com o ensino universitário e com o ensino técnico. Isso é uma marca, sem dúvida. A outra marca é que ele está consolidando com as policlínicas e com os hospitais a economia da saúde. Hoje as regiões são outras em relação à saúde, não só em relação à rede de serviços, como também à estrutura das atividades econômicas que se desenvolve com as policlínicas, os hospitais regionais, as UTIs, as UPAs, somado às unidades básicas de saúde da família. Isso ele está fazendo de uma forma magistral. E ele está destravando os grandes investimentos da Bahia que vinham travados ao longo do tempo, que foram travados nos seis anos em que o PT esteve fora do governo federal, que é a Fiol Porto Sul, o Porto Salvador, o Estaleiro da Enseada do Paraguaçu e ainda todo a questão da apropriação da energia produzida na Bahia. Ele está fazendo coisas no ponto de vista de construir as bases da Bahia para o futuro, ele tem boas marcas, que é o cara que está modernizando a estrutura econômica do Estado e melhorando a vida social […] Então não dá para dizer que não tem marca, agora o que precisa é consolidar, isso aí é verdade. Precisamos consolidar essa liderança. Nós não podemos entrar no debate, por exemplo, sobre quem vai ser o senador. Eu quero saber quem é o governador e quem ele vai conduzir. Nós temos que discutir um novo tempo na Bahia, por isso não vou ficar discutindo se temos dois do PT se não é do PT. Para mim, o importante é como o nosso campo vai ficar unido em torno de Jerônimo e em torno de Lula, e aí a gente discute as chapas proporcionais e as chapas de senadores.
“O Lula tem que ganhar com uma margem na Bahia porque lá no Sul as coisas continuam mais ou menos parecidas […] O quadro lá embaixo não evoluiu”.
O senhor já antecipou um pouco da nossa pergunta sobre o Senado. Mas como o PT está lidando com esse movimento do senador Angelo Coronel, que praticamente declara independência ao dizer que será candidato a todo custo?
Primeiro, essa questão [do Senado] não é a questão estratégica central. A estratégia central é o Lula tem que ganhar com uma margem na Bahia porque lá no Sul as coisas continuam mais ou menos parecidas. Melhorou no Rio de Janeiro, mas se o governador de São Paulo for o candidato à reeleição endurece a disputa em São Paulo e nós não temos claro o que vamos fazer em Minas Gerais, no Rio Grande do Sul, no Paraná. O quadro lá embaixo não evoluiu. Então, a Bahia tem um papel central de liderar o Nordeste, porque o Nordeste deu 11 milhões de votos de frente para Lula, sendo quatro milhões na Bahia e Lula ganhou por dois milhões no Brasil. Essa é a disputa central. Os Brics, a China, a Rússia, a Índia, a África do Sul, os países árabes, todo mundo atento com o que vai acontecer no Brasil. O B dos Brics vai permanecer? Isso é uma coisa que para nós é importantíssima. E isso vai ser decidido aqui: O B de Brasil vai ser decidido no B da Bahia. Essa que é a minha preocupação, isso que me faz ficar 24 horas atento. E quem é que conduz isso? O governador Jerônimo. Porque a disputa vai se dar não pela capacidade de você ter voto para o Senado, e sim ter votos para presidente, para governador e para deputado, eleger bancada. Esse é o centro da disputa. Agora, é importante o Senado? É, porque nós precisamos ter voz no Senado, porque todas as ações passam no Senado. Mas aí Otto não é do PT e está dando show, todo o Brasil reconhece. Wagner dá show. Nós vamos definir aquilo que ajuda a unificar em torno de Jerônimo, de Lula e da possibilidade de a gente ampliar a bancada.
“Nós não podemos abrir um debate que não aponte a afirmação de uma liderança com maior longevidade, que é Jerônimo”.
O senhor foi um presidente que teve bancada forte em Brasília, na Assembleia, representação forte em Salvador e viu ao longo do tempo a representatividade do PT numericamente diminuir. Isso teve reflexo, por exemplo, na eleição do ano passado em Salvador, sobre a qual o senhor já fez críticas abertas. O que o partido precisa fazer para recompor aquela frente que se tinha tempos atrás?
Olha, vou lhe dizer qual é um dos orgulhos que eu tenho. Eu era representante do governo da Bahia em Brasília e veio a votação do impeachment da Dilma e nós tivemos 24 votos. Eu ajudei, inclusive, na época o governador Rui a coesionar nossa bancada para tomar essa definição. Então nós precisamos continuar com essa margem na bancada, que é com o crescimento do PT e com o crescimento dos aliados, eu não quero crescer sozinho, quero crescer com os aliados. Mas só que nós temos que ter atenção de que um projeto tem um centro, tem eixos que estão pela condução de uma centro-esquerda, que a esquerda lidera. Então nós temos que ter isso claro. E foi o que eu fiz quando fui presidente. Nós tivemos 94 prefeitos e o PSD tinha 77, o PP tinha 51. Todo mundo cresceu, o PSB tinha 35, o PCdoB tinha 18, o PDT tinha 24. Esse foi o resultado da eleição que eu coordenei como presidente do PT. Elegemos dez federais, mas todos partidos elegeram bancada. Então esse é o nosso objetivo para a gente não perder o eixo. E outra coisa, você não pode ficar discutindo onde tem lideranças consolidadas. Todos já foram presidente da Assembleia, ministro, governador, senador, deputado federal….então nós não podemos abrir um debate que não aponte a afirmação de uma liderança com maior longevidade, que é Jerônimo. Se não, vamos ficar discutindo desgaste de material. ‘Ah, eles não têm mais candidato e têm que usar os que já foram’. Aliás, por falar em desgaste de material, é o lado de lá que não tem candidato e fica buscando os que já foram candidatos a tudo e mais alguma coisa. Então, é essa linha que nós temos que evitar.
“A política é feita da capacidade de movimentos, mas eu acho que nós não podemos ficar presos apenas à questão de capturar lideranças do outro lado”.
O senhor é a favor desse momento que o governador faz para trazer prefeitos da oposição, que muitas vezes acaba até ferindo correligionários do PT?
A política é feita da capacidade de movimentos, mas eu acho que nós não podemos ficar presos apenas à questão de capturar lideranças do outro lado, apesar que você tem que capturar, mas não pode ser o central do seu movimento. O central do seu movimento é a gente conseguir dialogar com os setores que produzem na Bahia, com os setores importantes, os empresários, os trabalhadores, as universidades, os centros de pesquisa, as empresas, as cooperativas, é importante a gente ter um projeto consolidado nesses segmentos que fazem o dia a dia. Porque nas conveniências da política às vezes o prefeito vem, mas o deputado não vem, o vereador não vem, então é todo um jogo que faz parte da movimentação, mas não pode ser o centro da nossa movimentação.
1 Comentário
Paulo
•
09/11/2025
•
04:55

