Karla Borges

Economia

Professora de Direito Tributário, graduada em Administração de Empresas (UFBA) e Direito (FDJ) ,Pós-Graduada em Administração Tributária (UEFS), Direito Tributário, Direito Tributário Municipal (UFBA), Economia Tributária (George Washington University) e Especialista em Cadastro pelo Instituto de Estudios Fiscales de Madrid.

O ISS e o Carnaval

A forma de tributação do Imposto Sobre Serviços de Qualquer Natureza – ISS não é uniforme em todo o território nacional. Embora instituído pelos municípios brasileiros, existem atividades peculiares de prestação de serviços que não recolhem o imposto pela receita bruta auferida, mas por um regime especial de tributação, principalmente quando essas atividades são de difícil apuração no levantamento de sua base de cálculo. Fato que ocorre com os camarotes e os blocos de carnaval na capital baiana.
O Decreto 17.120/07 disciplina o licenciamento para desfile de entidade carnavalesca ou folclórica, trio elétrico e congêneres, a instalação e exploração do serviço de camarote, arquibancada e similares, o regime de estimativa da base de cálculo para o recolhimento do ISS, o nível de emissão sonora, a exibição de publicidade em geral, durante o período de Carnaval e de Festas Populares incluídas no Calendário Oficial da Cidade. Compete, portanto, a Secretaria Municipal da Fazenda – SEFAZ proceder à apuração do ISS relativo a esses serviços e o seu recolhimento, na forma e nos prazos estabelecidos na legislação tributária.

A base de cálculo do ISS dos blocos carnavalescos é igual ao produto do número de figurantes da entidade participante do desfile multiplicado pelo valor da participação individual, conforme estimado na pauta fiscal. Considera-se entidade o bloco de trio, inclusive infantil, de percussão e sopro, de índio, cordão, afro, afoxé ou qualquer associação formada para participar nos desfiles. Após o enquadramento de cada entidade nos itens da pauta fiscal será procedido o lançamento do imposto devido, notificando-se a entidade para, querendo, impugná-lo, no prazo de 10 dias, da data da ciência. A impugnação do lançamento deverá ser acompanhada dos elementos e documentos que comprovem as razões alegadas, cabendo ao órgão competente da Secretaria acatá-las ou rejeitá-las. Importante salientar que a Lei 8421/13 acrescentou o parágrafo 3º ao artigo 94 da Lei 7186/06 retirando das impugnações e recursos vinculados ao regime de estimativa o efeito suspensivo, contrariando, assim, o Código Tributário Nacional.

No caso dos camarotes, o valor do ISS é encontrado aplicando a seguinte fórmula: VALOR DO ISS = NP x VM x ND x AV, onde NP = número estimado de pessoas, calculado com base na área total licenciada, considerando a razão de 2 pessoas por m2; VM = valor médio dos preços dos ingressos (camisa, pulseira, etc.), considerando-se o número de dias de funcionamento; ND = número de dias de funcionamento do Camarote (mínimo de 3 e máximo de 6 dias); AV = alíquota vigente do ISS. Nesses serviços, quando não houver cobrança de ingresso, a base de cálculo do imposto será o valor recebido a título de patrocínio, comprovado e declarado pelo promotor do evento, ou, na falta de comprovação, o apurado ou estimado à luz das despesas efetuadas e do valor cobrado por estabelecimento semelhante.

Eis que no dia 25.02.14, dois dias antes da abertura oficial do Carnaval, a Prefeitura de Salvador publica o Decreto 24.808/14 estabelecendo novos critérios gerais para a apuração da base de cálculo do ISS das atividades, sob o regime de estimativa. Promove, entretanto, uma pequena alteração prevista no parágrafo 2º do art. 5º: “Tratando-se de serviços de exploração de camarote, arquibancada, palco e similares, o número estimado de pessoas a que se refere o art. 6º do Decreto nº 17.120/07, calculado com base na área útil indicada pelo órgão competente da Prefeitura será de 2 pessoas por m² para áreas de até 500 m², sendo que será considerada 1 pessoa para cada m² excedente, quando for o caso”. Antes o cálculo era feito levando-se em conta 2 pessoas por m² sem delimitar o espaço. Entende-se por área útil a área total do camarote, arquibancada, palco e similares excluídas as áreas de serviço, apoio técnico e circulação, como rampas de acesso, circulação com largura máxima de 1,20 m, escada, elevadores, sanitários, cozinha, posto médico e similar.

Percebe-se, desta forma, que houve uma redução drástica na apuração da base de cálculo dos grandes camarotes em relação aos anos anteriores, impondo um tratamento diferenciado de acordo com o tamanho. Quanto maior o camarote, menor o valor do imposto a pagar e quanto menor o camarote maior será a tributação. Um camarote, por exemplo, de 10.000 m², considerando 2 pessoas por m², totalizava 20.000 na legislação anterior. Na nova sistemática, até 500 m², multiplicando-se por 2 equivale a 1.000, os 9.500 restantes, considerando uma pessoa por m², totaliza 10.500 (1.000+ 9.500), sendo quase metade do valor do ano passado. Ou seja, quem pode mais, paga menos e quem pode menos, paga mais.

Todavia o problema é ainda mais complexo: como a administração municipal publica um Decreto determinando novas regras de tributação a dois dias do Carnaval e obriga o contribuinte a promover o recolhimento do imposto sob pena de não ter a liberação do funcionamento? Não se trata de defender ou combater o novo cálculo, uma vez que não se demonstrou o porquê da súbita alteração, mas padece a indignação com o descaso da gestão fazendária em relação ao prazo exíguo imputado ao contribuinte, principalmente em relação à possibilidade de adesão ao regime de tributação pela receita real para o carnaval de 2014, publicado apenas no Diário Oficial de 26.02.14 através da Instrução Normativa 10/14. Será que a tributação do Carnaval de Salvador será mais uma questão a ser judicializada?

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