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01 de dezembro de 2016 | 07:39

Medidas contra corrupção e blefe, por Raul Monteiro

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O tempo vai mostrar que foi uma infelicidade a escolha do deputado federal Onix Lorenzoni (DEM-RS) para relator das 10 medidas contra a corrupção defendidas pelo time de procuradores da Lava Jato. Aliado à ingenuidade – ou à presunção – do time do Ministério Público, que considerava que conseguiria pressionar os ilustríssimos deputados pela imprensa e por meio de mensagens nas redes sociais, associando a aprovação das medidas à continuidade da Operação que tem prestado o inestimável papel de passar o Brasil a limpo, o resultado foi a completa desfiguração do projeto, como se viu na madrugada de ontem.

Ao ameaçarem com uma renúncia coletiva, caso a aprovação do crime de abuso de autoridade para juízes e procuradores e promotores não seja revista durante a votação no Senado, ou mesmo vetada pelo Executivo, na hipótese de os senadores a ratificarem, os combatentes da Lava Jato demonstraram que definitivamente não sabem lidar com o Congresso, mais difícil de controlar do que um presidente fragilizado como Michel Temer (PMDB), que só antecipou sua indisposição contra a anistia ao Caixa 2 pelo simples fato de quase ter ido às cordas com o caso do ex-ministro Geddel Vieira Lima (secretaria de Governo).

Só mesmo muita inocência para acreditar que, quando o relator Lorenzoni deixou as propostas contra a corrupção praticamente intactas, como foram sugeridas pela Lava Jato, havia alguma garantia de sua aprovação literal na Câmara dos Deputados. Mesmo que grande parte dos parlamentares não estivesse ameaçada pela Operação deflagrada em Curitiba, que pretende punir quem se utilizou de Caixa 2, desconsiderando que o sistema político brasileiro funcionou desta forma todos estes anos e que seu uso não comprova necessariamente corrupção, o Legislativo não as absorveria goela abaixo.

Afinal, é próprio do Parlamento, numa democracia, discutir à exaustão matérias de impacto como as sugeridas e alterá-las, papel em que deve se engajar de corpo e alma e com responsabilidade, na busca de consensos, o relator, o que não aconteceu neste caso. Não se sabe se por medo da Lava Jato ou simplesmente porque gostaria de ser destacado como uma espécie de padre no meio de um bordel, Lorenzoni simplesmente desconsiderou suas atribuições, aderindo de forma acrítica ao proposto, apesar de seus colegas terem divulgado um vídeo em que ele mesmo aparecia criticando a Lava Jato.

Chamou a atenção, na coletiva que deram ontem ameaçando renunciar, o fato de os atacantes da Lava Jato não terem destacado a vitória com relação à criminalização do Caixa 2, um das exigências pelas quais se bateram desde a apresentação das propostas no Congresso. Pelo contrário, buscaram enfatizar seu repúdio à decisão que lhes atribui abuso de autoridade, condicionando sua manutenção na Operação à revisão deste item, o que apenas reforça o argumento de muitos deputados de que não passam de corporativistas. Triste ter que admitir, pelo menos, que não entendem como funciona uma democracia e torcer para que a ameaça de renúncia seja um blefe.

* Artigo publicado originalmente no jornal Tribuna da Bahia

Raul Monteiro*
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