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Auditores do trabalho acusam Marinho de fragilizar combate a trabalho análogo à escravidão
Auditores do trabalho acusam Marinho de fragilizar combate a trabalho análogo à escravidão
Ministro do Trabalho quer recorrer de decisão judicial que incluiu empresas na lista suja do trabalho escravo
Por Fernando Canzian/Folhapress
05/12/2025 às 17:45
Foto: Valter Campanato/Agência Brasil/Arquivo
O ministro do Trabalho e Emprego (MTE), Luiz Marinho
Cerca de 390 auditores fiscais do trabalho (a totalidade da categoria) paralisaram suas atividades em protesto contra as ações do ministro do Trabalho e Emprego (MTE), Luiz Marinho, acusando-o de fragilizar o combate ao trabalho análogo à escravidão e assediar moralmente os servidores públicos.
O movimento é uma resposta direta às interferências do ministro, segundo os auditores, que beneficiaram empregadores flagrados pelos fiscais.
O estopim do protesto foi a decisão do MTE de recorrer da sentença da Justiça do Trabalho, proferida na última terça (2), que determinou a inclusão imediata da JBS Aves e de outras duas empresas (Santa Colomba Agropecuária e a Associação Comunitária de Produção e Comercialização do Sisal, Apaeb) na chamada lista suja do trabalho escravo.
Na sentença, a juíza Katarina Mousinho de Matos, da 11ª Vara do Trabalho de Brasília, determinou que a JBS Aves e as demais empresas fossem imediatamente incluídas na lista. A magistrada reforçou que, existindo decisão administrativa final por infração de trabalho análogo à escravidão, a inclusão é obrigatória, e que não pode haver "filtros adicionais ou exceções casuísticas".
A crise na Inspeção do Trabalho se intensificou após Marinho usar o poder de "avocação" para tomar para si processos administrativos que já haviam concluído pela inclusão de empregadores na lista suja.
Os auditores classificam essa ação como "indevida" e citam que ela cria uma instância recursal administrativa extra, que não segue critérios técnicos de Inspeção ao Trabalho.
Segundo Rodrigo de Carvalho, da Associação Nacional dos Auditores Fiscais do Trabalho, "nem nos governos mais contrários à fiscalização o recurso da avocação por parte do ministério ocorreu". "É quase surreal que o cerceamento ocorra justamente pelo Partido dos Trabalhadores", afirma.
Segundo ele, os processos de avocação correm em sigilo, mas haveria outros 14 que o MTE estaria querendo controlar.
O caso mais notório envolveu a JBS Aves, que foi inicialmente retirada da lista após Marinho decidir reavaliar seu processo pela consultoria jurídica do ministério. A Advocacia-Geral da União (AGU) chegou a citar a "relevância econômica" da JBS como justificativa para a avocação. Além da JBS, Marinho suspendeu a publicação da lista envolvendo as outras duas empresas.
A decisão judicial de terça foi uma derrota para o ministro. A juíza Matos classificou a ação do MTE como uma "tentativa de obstrução do cumprimento da sentença" e afirmou que os argumentos usados (como a relevância econômica citada pela AGU) comprovam que o parecer não seguiu critérios técnicos ou jurídicos, mas sim "econômicos e políticos".
Ela destacou que a invocação do porte econômico da empresa autuada configura um tratamento diferenciado e um "regime de exceção para grandes empresas".
A reportagem pediu posicionamento ao MTE, mas não recebeu resposta até o momento.
Os auditores fiscais que suspenderam a fiscalização afirmam que não realizarão "novas operações de combate ao trabalho escravo em âmbito nacional e regional", embora as operações já iniciadas serão concluídas.
O caso teve início no ano passado, quando uma operação federal encontrou dez pessoas trabalhando em condições análogas à escravidão em uma empresa responsável por carregar e descarregar cargas para uma unidade avícola da Seara (empresa da JBS), no Rio Grande do Sul.
Segundo os investigadores, os trabalhadores foram submetidos a turnos de até 16 horas e estavam alojados sem acesso a água potável. Além disso, a empresa contratada também havia feito descontos nos salários, o que dificultava a demissão dos trabalhadores.
Em agosto, os fiscais decidiram que a JBS era responsável pelas condições no local, pois não realizou diligências que garantissem que a empresa terceirizada assegurava o mínimo por lei aos trabalhadores.
Em nota, a JBS disse que a Seara encerrou o contrato e bloqueou o prestador de serviços assim que tomou conhecimento das denúncias. Disse também que contratou uma auditoria externa para checagem da documentação dos trabalhadores de empresas terceiras
Já a Apaeb disse, também em nota, que é um grupo sem fins lucrativos, que trabalha desde 1980 para melhorar a vida de pequenos produtores rurais no sisal e que não possui fazendas do produto. A Santa Colomba não se manifestou.
