Karla Borges

Economia

Professora de Direito Tributário, graduada em Administração de Empresas (UFBA) e Direito (FDJ) ,Pós-Graduada em Administração Tributária (UEFS), Direito Tributário, Direito Tributário Municipal (UFBA), Economia Tributária (George Washington University) e Especialista em Cadastro pelo Instituto de Estudios Fiscales de Madrid.

STF altera a sujeição passiva do IPTU de imóveis públicos

A decisão de repercussão geral do Supremo Tribunal Federal (STF) de abril do ano passado, permitindo a cobrança do Imposto sobre a Propriedade Predial e Territorial Urbana (IPTU) de empresas privadas que ocupam imóveis públicos surpreendeu os estudiosos da matéria. Do ponto de vista econômico, nada mais justo, afinal o exercente da atividade econômica seria beneficiado com a impossibilidade de tributação, reduzindo o seu custo e colocando-o em situação de vantagem perante os seus concorrentes. Todavia, do ponto de vista jurídico-tributário, promove-se uma modificação na sujeição passiva do imposto, contrariando os dispositivos constitucionais e o próprio Código Tributário Nacional (CTN).

A Constituição Federal (CF) reza que cabe a Lei Complementar definir os contribuintes, portanto é o Código Tributário Nacional (CTN) que determina no seu artigo 34 quem são os contribuintes do IPTU: o proprietário do imóvel, o titular do seu domínio útil ou o seu possuidor a qualquer título. São apenas dois os sujeitos passivos da obrigação tributária: o contribuinte que é a pessoa obrigada ao pagamento do tributo quando tenha relação pessoal e direta com o fato gerador; e o responsável, quando não sendo contribuinte, sua obrigação decorra de disposição expressa de lei.

O CTN é claríssimo quando dispõe que as convenções particulares, relativas à responsabilidade pelo pagamento de tributos, não podem ser opostas à Fazenda Pública, para modificar a definição legal do sujeito passivo das obrigações tributárias correspondentes. O STF, portanto, deu uma nova interpretação à lei, ultrapassando os limites da sua competência. Ora, se o imóvel pertence à União, aos Estados, ao Distrito Federal ou aos Municípios, ele está amparado pela imunidade tributária recíproca, prevista no artigo 150, inciso VI, alínea a, que proíbe a instituição de impostos sobre o patrimônio, renda ou serviços uns dos outros.

A decisão do STF afastou a imunidade tributária para cobrança do IPTU de terreno público cedido a empresa privada ou de economia mista, com o fundamento de que a imunidade recíproca prevista na CF, que impede entes federativos de cobrarem tributos uns dos outros, não alcança imóveis públicos ocupados por empresas que exerçam atividade econômica com fins lucrativos. O problema crucial é que essas empresas não configuram no sistema tributário vigente como contribuintes ou responsáveis. Como atribuir responsabilidade a um terceiro não previsto em lei?

Ainda que o particular usufrua de um benefício de pessoa pública, para haver imputação de responsabilidade pelo pagamento do tributo, faz-se necessário alterar o fato gerador da obrigação tributária, do contrário, o STF não está interpretando, mas modificando o texto constitucional e a lei complementar, extrapolando as suas atribuições. O argumento de que o particular, no exercício de atividade econômica lucrativa, termina por usufruir de benefício de pessoa pública pode ser rebatido, se o ente público passar a cobrar um valor maior pelo imóvel cedido, de forma a compensar o não pagamento do tributo.

Imagina-se que se a filosofia adotada pelo STF for essa, em breve, os inquilinos tornar-se-ão sujeitos passivos da obrigação tributária, passando a sofrer execução fiscal pelo não pagamento do IPTU, apenas pela posse precária do imóvel. Não se trata de favorecimento, mas de obediência aos preceitos legais. O fato é que nem o concessionário nem o locatário jamais poderiam figurar no pólo passivo da obrigação por não serem contribuintes, nem responsáveis, por não preencherem nenhum dos requisitos da relação tributária e a definição do sujeito passivo do IPTU não cabe interpretação.

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