Elias de Oliveira Sampaio

Políticas Públicas

Economista do Ministério da Economia. Mestre em Economia e Doutor em Administração Pública pela UFBA. Autor de diversos trabalhos acadêmicos e científicos, dentre eles o livro Política, Economia e Questões Raciais publicado - A Conjuntura e os Pontos Fora da Curva, 2014 a 2016 (2017) e Dialogando com Celso Furtado - Ensaios Sobre a Questão da Mão de Obra, O Subdesenvolvimento e as Desigualdades Raciais na Formação Econômica do Brasil (2019). Foi Secretário Estadual de Promoção da Igualdade Racial (Sepromi) e Diretor-presidente da Companhia de Processamento de Dados do Estado da Bahia (Prodeb), Subsecretário Municipal da Secretaria da Reparação de Salvador (Semur), Pesquisador Visitante do Departamento de Planejamento Urbano da Luskin Escola de Negócios Públicos da Universidade da Califó ;rnia em Los Angeles (UCLA), Professor Visitante do Mestrado em Políticas Públicas, Gestão do Conhecimento e Desenvolvimento Regional da Universidade do Estado da Bahia (Uneb). Professor, Coordenador do Curso de Ciências Econômicas e de Pesquisa e Pós-Graduação do Instituto de Educação Superior Unyahna de Salvador.

O inverno está chegando!

Esse é o lema da Casa dos Starks, uma das famílias da nobreza da mítica terra de Westeros, da série Games of Thrones. Ele significa muito mais do que uma referência as mudanças de estação do ano como conhecemos. Naquele mundo, as estações não possuem um tempo pré-definido e sua chegada e tempo de permanência são desconhecidos. Por isso, todos devem estar sempre preparados para a situação climática mais hostil para as pessoas naquela sociedade: o rigoroso inverno vindo das terras do norte.

Muito diferente do contexto desta pequena digressão, as nossas quatro estações do ano, definidas no tempo e no espaço, com previsibilidade razoável, permite-nos saber quais serão os nossos períodos de sol, de chuva, de frio e de frutas, desde sempre. O tempo das estações, em nosso mundo, também é uma fonte muito importante para o que devemos fazer ou não fazer em termos de planejamento e ações para que de uma simples “mudanças de tempo”, esses momentos comuns da nossa vida não se tornem uma loteria para a sobrevivência de alguns. Ou seja, exceto nos casos de fenômenos climáticos extremos, não temos como apontar as características ordinárias de nossas estações do ano como responsáveis pelos graves problemas que vimos enfrentando nas últimas semanas, particularmente, em Salvador.

As consequências das fortes chuvas que vem pairando por sobre a cidade, se devem mais pela histórica omissão governamental e escolha política de nossas elites dirigentes, em todos os níveis de governo, do que pela força da natureza, em si. Há uma responsabilidade política pelas vidas que foram perdidas e não devemos admitir que em pleno século XXI, na terceira maior capital do país, ainda estejamos perdendo pessoas pelo efeito de uma característica climática conhecida por todos os agentes políticos responsáveis pela gestão de nosso território. Infelizmente, mesmo com todos esses acontecimentos, o discurso oficial permanece o mesmo de outrora. De um lado, a aparente surpresa pela intensidade e persistência dos índices pluviométricos que por maiores que possam ocorrer, estatisticamente, devem estar dentro de uma média previsível, dentro de uma periodicidade que os órgãos de planejamento e defesa civil normalmente trabalham ou deveriam trabalhar.

Por outro lado, assiste-se a um sem número de entrevistas por parte das pessoas responsáveis pelo órgãos de planejamento e prevenção que dizem tudo, menos uma explicação plausível do porque não fizeram, de maneira eficaz e efetiva, aquilo que deveria ser feito em função de sua atribuição institucional, per si: intervenções públicas eficazes para impedir que uma cidade com as proporções populacionais de Salvador, fique à mercê de um fenômeno climático tão conhecido e recorrente para por nós, como a lavagem do Bonfim na primeira quinzena de janeiro, em todos os janeiros!

Os jargões normalmente ouvidos nesses momentos são excelentes indicadores tanto da omissão de quem deveria ser proativo para que essas situações fossem evitadas, quanto de uma escolha política que abstrai das prioridades de gestão, as áreas da cidade mais vulneráveis a momentos de maior ou menor alteração climática. Por isso, dizer que a cidade está enfrentando “as maiores chuvas dos últimos vinte anos” não é um argumento razoável para justificar as mortes e os transtornos causados em Salvador devido as chuvas. Ao contrário, deveria ser exatamente nos momentos que não tivéssemos fenômenos climáticos extremos – os últimos vinte anos, no mínimo – que teríamos que aplicar toda a nossa tecnologia e orçamento disponíveis para nos preparar para a possível ocorrência dessas intempéries. Isto é, a pergunta que não pode deixar de ser feita é qual o motivo que, num espaço de tempo que contemplava cinco mandatos eletivos diferentes, nos três entes federativos, não foram feitas as ações necessárias para proteger a cidade e seus cidadãos de momentos como esse que ora estamos vivendo?

Obviamente que os elementos naturais são variáveis muito importantes nesses acontecimentos, no entanto, eles não devem ser vistos como condições suficientes para as consequências deletérias que historicamente ocorrem no período chuvoso de Salvador. É a falta de políticas públicas de planejamento e organização urbana adequadas, para uma cidade com as características da capital da Bahia, que é a variável principal para todos os problemas que estamos enfrentando. Na verdade, é exatamente devido a sazonalidade na ocorrência de chuvas intensas, em nossa região, que podemos afirmar que a ausência ou insuficiência de políticas e ações apropriadas de planejamento urbano, até mesmo em nível metropolitano, são os elementos impeditivos para mitigar os efeitos mais graves dos momentos em que as nossas características climáticas apresentam “pontos fora da curva” do seu período de maior normalidade estatística.

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