Karla Borges

Economia

Professora de Direito Tributário, graduada em Administração de Empresas (UFBA) e Direito (FDJ) ,Pós-Graduada em Administração Tributária (UEFS), Direito Tributário, Direito Tributário Municipal (UFBA), Economia Tributária (George Washington University) e Especialista em Cadastro pelo Instituto de Estudios Fiscales de Madrid.

Decisão do STF não atinge as empresas de advocacia

A recente decisão do Supremo Tribunal Federal – STF, que considerou inconstitucional lei municipal que estabelece impeditivos à submissão de sociedades profissionais de advogados ao regime de tributação fixa, em bases anuais na forma estabelecida por lei nacional, definitivamente não atinge as sociedades empresárias de advocacia. A maioria das leis municipais acata a tributação privilegiada das sociedades de profissionais, com base no entendimento da manutenção dos parágrafos 1º e 3º do artigo 9º do Decreto-Lei 406/68. Os fiscos municipais costumam apenas desenquadrar os escritórios de advocacia quando constatam que eles são sociedades empresárias.

O artigo 16 do Estatuto da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) teve a sua redação alterada pela Lei 13.247/16, dispondo que não são admitidas a registro nem podem funcionar todas as espécies de sociedades de advogados que apresentem forma ou características de sociedade empresária, que adotem denominação de fantasia, que realizem atividades estranhas à advocacia, que incluam como sócio ou titular de sociedade unipessoal de advocacia pessoa não inscrita como advogado ou totalmente proibida de advogar. Todavia, na prática, as ocorrências são distintas.

O contrato social pode estar formalmente dentro dos padrões exigidos pela OAB no momento do seu registro; entretanto, os procedimentos contábeis e fiscais muitas vezes adotados posteriormente contradizem as exigências previstas no próprio estatuto da Ordem. Há, assim, uma real contradição com a proibição prevista no parágrafo 3º do mesmo artigo 16, quando veda o registro, nos cartórios de registro civil de pessoas jurídicas e nas juntas comerciais, de sociedade que inclua, entre outras finalidades, a atividade de advocacia, uma vez que é de conhecimento notório a existência de escritórios que não podem ser considerados sociedades de profissionais, mas sociedades empresárias.

A condição de sociedade empresária não tem relação somente com o porte, o tamanho, mas com as atividades desempenhadas e as operações contábeis realizadas. Num escritório de advogados, a remuneração dos sócios só poderia ocorrer através de pró-labore, que nada mais é do que a remuneração paga pelo labor diante da exigência legal de pessoalidade na prestação dos serviços. A opção de distribuição de lucros entre os sócios sepultaria a condição de sociedade de profissionais, tendo em vista que o lucro corresponderia à remuneração do capital investido na empresa.

Deve-se deixar claro que nada impede o auferimento de lucros por parte dos escritórios em geral, o que não poderia ocorrer é a sua distribuição, considerada retorno de investimento aplicado de acordo com as quotas de participação de capital, distinção marcante de sociedade empresária. A partir do momento que uma sociedade de advogados distribui lucros, o exercício da profissão constitui elemento de empresa, do contrário, os sócios seriam remunerados por pró-labore. Quando ela contrata advogados para se associarem e prestarem serviços em nome da sociedade descaracterizaria a natureza da sociedade de profissionais, conforme artigo 966 do Código Civil; afinal, auxiliares e colaboradores não poderiam ser advogados, agindo e atuando como se sócios fossem.

Configurar-se-ia, assim, o exercício profissional da atividade econômica. A distribuição de lucros seria sempre incompatível com a pessoalidade na prestação de serviços, como define a legislação federal, no parágrafo quinto, artigo 201 do Decreto 3.048/1999. Ademais, se a sociedade de profissionais insistir em afirmar ao fisco municipal que os valores pagos aos sócios a título de distribuição de lucros ocorrem em decorrência do trabalho e não da participação do capital social, automaticamente teria que oferecer esses valores à tributação da União, leia-se Receita Federal, com o devido recolhimento do INSS e do IR correspondentes.

O Superior Tribunal de Justiça (STJ) já se manifestou sobre a questão, determinando que para ter direito ao regime fixo que tem por suporte o §3º do Art. 9º do Decreto-Lei 406/68, a sociedade não pode ter caráter empresarial, sendo sua principal característica a pessoalidade, isto é, o envolvimento pessoal e direto do profissional no exercício da atividade. A jurisprudência costuma validar os requisitos da legislação municipal, inclusive no tocante à aferição da ausência de pessoalidade, atributo da atividade empresarial, excludente, por sua vez, do regime.

Há, dessa forma, uma enorme incompatibilidade entre o labor e a distribuição dos lucros, pois só pró-labore remunera o trabalho intelectual, incidindo os tributos federais, sendo a distribuição de lucros vinculada à quota de investimento na sociedade, não ao labor. A decisão do STF, seguramente, refere-se às sociedades que, concretamente, apresentam pessoalidade na prestação dos serviços, fazendo jus à tributação diferenciada, quando os sócios que a integram promovem retiradas através de pró-labore, não usufruindo, portanto, da não tributação dos lucros.

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