Foto: Dida Sampaio/Agência Estado/Arquivo
Presidente Jair Bolsonaro promoveu reunião com o objetivo de formalizar um "pacto" em defesa do país 30 de maio de 2019 | 09:11

O que Bolsonaro faz para impedir o toma lá dá cá?, por Raul Monteiro*

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Depois da reunião dos presidentes dos três Poderes, na última terça-feira, em torno de um pacto pelo país, o clima parece efetivamente ter melhorado entre eles. Pelo menos até a próxima crise que, se seguir o script a que o país se acostumou nestes cinco meses de novo governo, pode ser produzida pelo presidente Jair Bolsonaro, seus filhos, seus ministros ou seu próprio partido, o PSL, que, como se viu até aqui, dispensam oposição. De toda forma, o apelo feito pelo presidente em torno de um entendimento não deixa de ser um avanço em relação a toda a confusão, a maior parte desnecessária, a que o país já assistiu de camarote enquanto a economia se deteriora a cada dia.

Por outro lado, de nada adiantará o café da manhã de terça, se cada um dos representantes máximos do Executivo, do Legislativo e do Judiciário não cumprirem seu papel, embora, até aqui, o maior déficit de ação possa recair claramente sobre os ombros da Presidência da República. Afinal, enquanto não se assumir como dono das reformas ou seu mais genuíno portador e defendê-las abertamente, afastando-se do populismo com que tem se comportado, de nada adiantará Bolsonaro se queixar de que a culpa é dos outros, especialmente do Congresso, ainda que se saiba que o Poder está longe de ser integrado por anjos altruístas e desinteressados.

Com efeito, Bolsonaro joga com alguma inteligência, qualidade com que seus principais críticos não o distinguem, ao buscar atiçar a sociedade contra o Congresso e o Supremo Tribunal Federal como forma de desviar o foco de sua própria inação. Para falar a verdade, os dois Poderes têm feito muito pouco, historicamente, para aliviar o sofrimento do povo brasileiro, demonstrando, sempre que podem, estar mais interessados em salvar a própria pele e os interesses e privilégios de seus integrantes do que defender aqueles da maioria da sociedade.

A sacada do presidente é ter percebido a tempo que, com o declínio do petismo como força a que deva se opor ou enfrentar, ele precisava encontrar novos algozes a que combater, na falta da apresentação de uma agenda construtiva de que o país tanto necessita e cujo papel dele seria exatamente capitanear e implementar sem tanta demora. Demonizar uma classe política profundamente desgastada e um STF que perdeu o respeito da sociedade, colocando na conta da exigência de cargos e espaços no governo em troca de apoio na Câmara e no Senado o impasse para governar, pode até funcionar por algum tempo, mas não vai durar o período do seu mandato.

Afinal, se não deseja mesmo se submeter ao toma lá dá cá que insinua repudiar como traço da velha política que professa combater por que até agora, em cinco meses de gestão, o presidente não apresentou à sociedade e ao próprio Congresso um fornido programa de privatizações capaz de diminuir o Estado brasileiro e reduzir, desta forma, o espaço que possa servir como base de troca do governo com deputados e senadores? Com certeza, se soubesse o que fazer e tivesse natural disposição para tanto, Bolsonaro não geraria tanto barulho por nada enquanto o país patina, sem perspectiva, numa crise que, embora não tenha criado, ele tem a obrigação de combater.

* Artigo do editor Raul Monteiro publicado na edição de hoje da Tribuna.

Raul Monteiro*
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