Foto: Estadão
23 de outubro de 2017 | 10:04

A corrupção militar está aí, por Raul Monteiro*

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Para as mentes tortas que defendem uma intervenção militar como alternativa ao descalabro da corrupção no país espera-se que tenha funcionado como uma verdadeira ducha de água fria e um chamamento à realidade a recente reportagem do UOL mostrando que o Ministério Público detectou o desvio de R$ 191 milhões nas Forças Armadas. Retrato da degradação moral das instituições brasileiras, intensificada na última década, a comprovação de que os militares não estão imunes à corrupção tem o lado absolutamente positivo de mostrar, entre os desajustados devaneios autoritários que se apresentam em momentos de crise, que não não há solução fora da democracia.

Chegou-se aos números a partir de investigações conduzidas pelo Ministério Público Militar (MPM) e um levantamento inédito do Superior Tribunal Militar (STM), a pedido do UOL. As denúncias, dizem a reportagem, apontam para desvios praticados tanto por praças quanto por oficiais de alta patente, o que dá uma dimensão de como a corrupção pode se espalhar nos vários níveis da instituição, como mostram os casos levantados: vão de cobrança de propina em contratos a roubos de tanques militares. A reportagem revela que mais de uma centena de militares já foi condenada por crimes desse quilate entre 2010 e 2017.

Mas o maior valor do trabalho é a confirmação de como a falta de transparência no controle dos gastos pode criar o ambiente perfeito para que a corrupção se propague. E contra o que conspira um regime autoritário, senão contra a liberdade e a transparência? Ou será que alguém de sã consciência acredita que é possível entregar o país a um setor, formado por seres humanos normais, com plenos e irrevogáveis poderes, inclusive o de auto-fiscalizar-se, achando que de suas entranhas só brotarão exemplos de grandeza e compromisso com a defesa do interesse público?

A tese é facílima de comprovar por outra leitura extraída do levantamento – a de que o perfil dos casos de corrupção entre os militares é semelhante aos registrados em outras instituições públicas civis, nas quais pode-se se incluir facilmente a classe política contra a qual os defensores da saída militar acreditam que estão lutando. Bom ouvir na reportagem a avaliação do procurador-geral da Justiça Militar, Jaime Cassio de Miranda: “As Forças Armadas não estão imunes à corrupção. O crime existe. Tanto que estamos (MPM) aqui”, diz, negando, entretanto, que a corrupção seja sistemática na instituição.

Portanto, caros defensores da guinada autoritária em detrimento da democracia, o argumento de que militares podem dar “um jeito” num país carcomido pela corrupção não procede. Eles próprios padecem dos mesmos defeitos que existem em todo os lugares e para os quais o enfrentamento técnico é o da fiscalização da sociedade, diretamente e por meio das instituições de que se dispõe, atributo incompatível com qualquer ditadura. Quem deseja abrir mão de exercer sua cidadania e lutar por uma sociedade melhor que continue acreditando em Papai Noel!

* Artigo publicado originalmente na Tribuna da Bahia por Raul Monteiro, jornalista e editor deste Política Livre.

Raul Monteiro*
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