Foto: Facebook de Lídice da Mata
História: Lídice, tendo ao lado Bete, discute com ACM na saída do 2 de Julho 03 de julho de 2014 | 09:13

Sinais de guerra na sucessão baiana, por Raul Monteiro

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Lídice da Mata fora eleita prefeita de Salvador confrontando o carlismo, que comandava com mão de força a política estadual, quando ela e o então todo poderoso senador Antonio Carlos Magalhães, à frente de um grupo grande e majoritariamente masculino onde estavam, entre outros, Paulo Souto, na época governador, protagonizaram publicamente um enfrentamento verbal que quase resulta em briga em plena abertura da festa cívica do 2 de Julho, comemorativa da Independência do Brasil na Bahia. ACM queria passar, com seu destacamento, à frente de Lídice, que, na condição de prefeita, reivindicava o direito de conduzir o cortejo.

À medida que se aproximava da prefeita, o senador, conhecido também pelo perfil provocador, a instigava com críticas como forma de pressioná-la para que lhe
desse passagem e a seu time. Lídice resistia quase solitária, apoiando-se apenas na então vice-prefeita Bete Wagner, na época jovem e frágil como ela, o que compunha um retrato enternecedor. Bete ria de nervoso, mais propensa a se ver livre logo de ACM e seu grupo do que a chefe do governo municipal. A contenda revelaria o que todo mundo sabia: Lídice e ACM eram inimigos pessoais.

Não se suportavam para além do campo político e partidário, onde sempre militaram em lados opostos até a morte do senador. Num determinado momento da disputa por espaço em plena Lapinha, Lídice irritaria-se de tal forma com o comportamento de ACM que se voltaria contra ele e, envolta em cólera, dispararia: – Desencarna, ACM!, ouvindo de volta um impropério. A imagem, flagrada por fotógrafos e presenciada por vários jornalistas, marcaria um momento ímpar de resistência política na história recente da Bahia e da tensão que, em eventos públicos, oporia sempre oposição e governo no Estado no longo período de hegemonia carlista.

Lídice se orgulha do feito até hoje. Caso contrário, não rememoraria o episódio com uma belíssima foto, registro preciso do momento exato em que discute com ACM em praça pública, divulgada por sua assessoria em seu Facebook por ocasião dos preparativos para a participação dela no 2 de Julho como candidata ao governo. De fato, a demonstração de bravura e força de uma pequenina mulher frente ao poderio de um grupamento político cujo líder era capaz de despertar medo físico em adversários e até em aliados marcou como acontecimento por seu inegável simbolismo.

Os embates entre forças governistas e oposicionistas, registrados ontem, em trechos do cortejo do Centro Histórico de Salvador, que acabaram em troca de socos e pontapés envolvendo uma militância de ambos os lados de cuja espontaneidade se têm todos os elementos para desconfiar, estão longe de representar o que significaram muitos anos atrás, quando Lídice comandava a Prefeitura de Salvador e ACM, a política estadual. Mas não deixam de prenunciar, dada a similitude do palco, o clima de acirramento político que se vive hoje em torno da disputa pelo poder estadual.

Ainda que Paulo Souto, candidato mais forte das oposições à sucessão estadual, e Rui Costa, seu adversário governista, não tenham liderado, pessoalmente, qualquer entrevero na festa de ontem, a atmosfera entre apoiadores de ambos esteve longe de ser amistosa no 2 de Julho, na opinião de quem fez o percurso acompanhando a passagem dos políticos pelo cortejo. Mais um sinal, entre tantos outros que já começam a aparecer, de que a corrida pelo Palácio de Ondina terá mais lances de guerra do que de paz até a proclamação do vencedor.

* Texto publicado originalmente na Tribuna da Bahia.

Raul Monteiro*
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